Monday, 3 January 2011
Alessandra Sanguinetti by Luisa santos
Alessandra Sanguinetti
Tales of Resistance and Change. Artists from Argentina.
Frankfurter Kunstverein, Frankfurt
20.Agosto – 30.Outubro 2010
Texto Luísa Santos
Tales of Resistance and Change. Artists from Argentina (Histórias de Resistência e de Mudança. Artistas da Argentina) surge sob o pretexto da Feira do Livro de Frankfurt de 2010, ano em que o país convidado é a Argentina. A exposição é um conjunto de olhares à prática artística contemporânea dos últimos dez anos, um período marcado por tensões políticas e económicas. A escolha do curador Argentino Rodrigo Alonso foca trabalhos e projectos em que os meios usados são directamente ligados com a percepção política e por um desejo de mudança social. Os trabalhos de Tales of Resistance and Change. Artists from Argentina têm em comum a partilha de processos e objectivos de artistas ou colectivos de artistas, agentes culturais e activistas.
O contexto Argentino
A Argentina é um país conhecido pelos esforços contra a impunidade e a exclusão social. A história da Argentina inclui diversidade de factos como a imigração do final do séc. XIX, o movimento populista de Peron e o regime militar do final do séc. XX em que milhares de pessoas perderam as vidas. Desde a recente crise económica, têm surgido vários movimentos de luta por justiça social.
A capital da Argentina, Buenos Aires, é casa para muitos grupos de activistas e organizações de direitos humanos. Estudantes viajam de todas as partes do país para conhecer e juntar-se aos activistas, líderes indígenas, organizadores rurais e outros grupos que partilhem as angústias e sonhos para o país.
Ao longo da última década, a arte na Argentina tem-se relacionado cada vez mais com a exploração das condições de produção no país e com projectos direccionados a grupos específicos da população. Depois de décadas de produção artística orientada para um mercado conduzido a políticas neo-liberais, a crise financeira criou respostas na arte numa procura de mudanças sociais.
No cenário da instabilidade de um novo século, artistas desenvolveram tácticas, projectos, e metáforas de resistência e transformação.
A união faz a força
A trabalhar de diferentes modos e com os meios disponíveis, muitos artistas examinam as condições sociais que os rodeiam e exploram as condições, os potenciais e as possibilidades para acção. De um modo natural, surgem projectos colaborativos com aspirações à integração social em que artistas e grupos de cidadãos partilham experiências e conhecimentos como meios de transformação imediata de realidades locais. Em alguns casos, há processos de integração entre artistas e grupos sociais minoritários. Um bom exemplo de integração seleccionado por Alonso para Tales of Resistance and Change. Artists from Argentina é o projecto Eloísa Cartonera, uma casa de publicação e um projecto editorial iniciado em 2003 pelos artistas Washington Cucurto (n. 1973) e Javier Barilaro (n. 1974). A produção dos livros faz a ligação entre a distribuição da literatura com o trabalho "cartoneros" (as pessoas que apanham cartão do lixo para vender). Os artistas usam textos fotocopiados doados por autores Latino-Americanos e encadernam-nos com capas de cartão pintado à mão, os mesmos cartões recolhidos pelos “cartoneros”. A distribuição é feita em livrarias e lugares alternativos de fora do alcance da distribuição das publicações convencionais e ajuda a tornar a literatura acessível a um público mais vasto.
Outros projectos que Tales of Resistance and Change. Artists from Argentina foca, servem como reflexões criticas sobre a realidade vivida na Argentina. É o caso do artista Argentino de renome internacional Tomás Saraceno (n. 1973) cujo trabalho consiste em sistemas expansivos interligados que desafiam os limites e a estabilidade dos espaços onde são instalados. Os seus jardins flutuantes podem ser entendidos enquanto processos de reconciliação, em que a natureza aprende a coexistir com a cultura, os espaços artificiais e os ambiente tecnológicos sem que percam a sua vitalidade. Num sentido mais lato – e também mais interpretativo -, estes jardins estes jardins são visualizações de um mundo em constante transformação, onde a sobrevivência depende dos processos de dialogo e adaptação.
As pessoas tomaram as ruas e encontraram a possibilidade de trabalhar em colaboração enquanto modo de lidar com a situação económica e social do país. Artistas Argentinos desenvolveram múltiplos modos de passar as dificuldades do dia-a-dia, aplicando a criatividade e desenvolvendo projectos artísticos para um contexto muito especifico e particularmente exigente.
No inicio do séc. XXI, surgiram todo o tipo de economias alternativas, como clubes de barbearias. Os trabalhadores apropriaram-se das fábricas de que foram despedidos e criaram negócios independentes. O grupo de Buenos Aires formado em 2002 sob o nome TPS -Taller Popular Serigrafia (Workshop de Serigrafia Popular) nasceu de um grupo de artistas e ilustradores cujas actividades entre 2002 e 2007 estavam relacionadas com as demonstrações públicas em Buenos Aires depois da crise de 2001. Durante essas demonstrações, membros do grupo imprimiam imagens relacionadas com os slogans dos cartazes e das roupas dos protestantes enquanto meio de resposta rápida aos acontecimentos políticos. A produção do grupo mostra comentários aos problemas dos trabalhadores, às fábricas que fecham e deixam famílias em meio de subsistência, denúncias à repressão policial, demonstrações de luta por direitos civis e resistência social. O grupo produziu uma revista sobre as actividades e ideias politicas para a exposição no Frankfurter Kunstverein.
O teatro e a performance de rua tornaram-se instrumentos de participação politica, com uma participação massiva dos cidadãos. Seguindo a importância crescente da performance na Argentina, foi criada uma forma especifica de performance, o escrache. Segundo Diego Benegas (Instituto Hemisférico de Performance e Politica, Buenos Aires) “O escrache é uma manifestação politica que emergiu na Argentina no virar do século pela organização H.I.J.O.S. Os membros do grupo H.I.J.O.S. começaram os escraches como modo de mostrar à comunidade a presença de crimes impunes da ditadura (1976-1983).” Outro exemplo também performativo e urbano mas com um tom poético, é o trabalho de Florencia Levy (n. 1979). As estruturas urbanas de Buenos Aires servem como cenário de investigação a Levy. Movida por um interesse em perceber os ritmos, lugares, sistemas operativos e as actividades dos habitantes da cidade, o seu trabalho explora as funções da esfera urbana da perspectiva do individuo. Em "Sistema de caminos: Buenos Aires" (System of Roads: Buenos Aires) Levy acompanha diferentes pessoas enquanto elas e movem pela cidade nos seus caminhos quotidianos para a escola ou trabalho. Num estilo flâneur e voyeur que lembra o trabalho de Sophie Calle (n. 1953, França), através da sua câmara, investiga as suas histórias emoções e pensamentos.
O curador Alonso deixa patente a sua escolha de título ao ínfimo detalhe. A exposição conta histórias – fala da realidade de um país repleto de História com momentos tão marcantes quanto difíceis – pelo que dedicou uma parte da exposição é dedicada a artistas que usam a ficção e os mitos para comentar a História real. Um exemplo notável é o vídeo "The Way Between Two Points (Terra Incognita)" de Sebastián Díaz Morales (n. 1975) que analisa um território sujeito a inúmeras idealizações na Argentina: a Patagónia. No filme, os únicos traços humanos visíveis são a paisagem desolada, legado da indústria do petróleo, mostrada para exemplificar as consequências da suposta prosperidade Argentina. A indústria do petróleo é baseada na exploração de recursos naturais, em que a sustentabilidade é considerada não económica, uma vez que não se vêm benefícios imediatos. Em "The Way Between Two Points" um trabalhador atravessa a vastidão desta terra incógnita repleta de imagens contraditórias de progresso e destruição.
Tales of Resistance and Change. Artists from Argentina poderia ser um título de um livro. Tal como páginas de um livro, as salas desta exposição lêem-se e contam-se no que se acredita ser um caminho colectivo tortuoso e lutador para um final, mesmo que a longo prazo, feliz.
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